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Serial Killers - Parte XI - Mitos Sobre Serial Killers Parte 6

#6: ELES SÃO TODOS BRANCOS Contrariando o mito popular, nem todos os serial killers são brancos. Serial killers existem em todos os gr...

quinta-feira, 21 de abril de 2016

NOTÍCIAS 18/04/2016 - 23/04/2016


19/04/2016


Mulher terá de indenizar ex-marido por esconder paternidade dos filhos
Uma mulher terá de pagar R$ 10 mil de danos morais ao seu ex-marido, por ter omitido, durante os anos de casamento, que ele não era pai biológico de seus dois filhos. A decisão é da 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. 

O homem ajuizou uma ação contra a ex-mulher requerendo indenização pelo dano moral decorrente do adultério. Ele contou que descobriu, por meio de exames de DNA, não ser o pai biológico dos dois filhos nascidos durante o período em que estiveram casados.

O pedido foi julgado procedente pela 2ª Vara Cível, Criminal e de Execuções Penais de São João de Nepomuceno. A mulher recorreu. Disse que não omitiu o adultério, por isso o ex-marido sabia que não era o pai biológico das crianças.

Ela relatou que contou ao ex-marido, pouco antes do casamento, que o primeiro filho foi concebido enquanto eles ainda namoravam. Já em relação ao segundo filho, ela disse que foi gerado em um período em que eles estavam separados e que contou ao ex que estava grávida, assim que reataram o relacionamento.

Para o desembargador Otávio de Abreu Portes, relator do caso, a traição conjugal não é tipificada como crime no Código Penal e, por isso, não é suficiente para a configuração de ato ilícito nem dano moral indenizável.

Porém, ele considerou que a ação dolosa da mulher em omitir do cônjuge traído a verdadeira paternidade biológica dos filhos tem a capacidade de provocar dano moral indenizável, por caracterizar ofensa à dignidade da pessoa. 

Fonte: Consultor Jurídico/ Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-MG.


Lei proíbe revista íntima em mulheres e reabre debate sobre segurança
Desde essa segunda-feira (18/4), as revistas íntimas em mulheres estão proibidas no país. A Lei 13.271/2016 veda a prática em empresas públicas e privadas, inclusive presídios. A norma prevê multa de R$ 20 mil em caso de descumprimento, a ser revertida a órgãos de proteção dos direitos da mulher. 

Essa é a primeira regra de alcance nacional sobre o tema e divide a opinião de especialistas. A revista íntima é vista como necessária para prevenir o uso de mulheres, seja companheira ou familiar do preso, para o transporte de drogas, celulares e outros itens proibidos para dentro dos presídios. Para isso, devem ficar nuas, se agacharem ou saltarem para a identificação de qualquer objeto escondido dentro do corpo — o uso de cães farejadores também é comum.

O principal argumento contra a medida é a preservação da dignidade humana e da intimidade e que não há norma que a autorize. O procedimento é expressamente proibido pela Resolução 5/14 do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. A Lei 10.792/03, em seu artigo 3º, prevê apenas o uso de detector de metal para a revista de quem quer entrar em estabelecimentos penais.

Para o advogado Rodrigo de Oliveira Ribeiro, que integra a Comissão de Política Criminal e Penitenciária da seccional fluminense da Ordem dos Advogados do Brasil, a lei vem na esteira da norma já existente no Rio de Janeiro, que faz a mesma proibição.

O membro da comissão da OAB-RJ elogia as inovações da lei, que estipula multa por descumprimento e, se comparada à norma do RJ, expande a abrangência ao citar o setor privado e toda a administração pública. Sobre a possibilidade de contrabando dentro dos presídios, Ribeiro diz que a alternativa é revistar os presos depois da visita íntima.

O advogado também cita como alternativa o uso de scanners corporais. “Por causa de um caso isolado há a maciça violação desses parentes que acabam marginalizados.” Em relação aos equipamentos, ele ressalta que o bom funcionamento das máquinas depende de uma sala especial, com temperatura inferior a 38 graus Celsius — a temperatura média do corpo humano é 36,5°C.

Intimidade não é absoluta
O delegado da Polícia Civil do Paraná e colunista da ConJur, Henrique Hoffmann, reconhece o uso de aparelhos como scanners corporais como uma medida ideal, mas que ainda não é possível excluir totalmente a revista íntima como recurso de segurança.

O delegado lembra ainda que não há lei federal proibindo a prática em cadeias e que o Código de Processo Penal, em seus artigos 240 e 244, permite as buscas. “De mais a mais, a intimidade não é direito absoluto, podendo ceder face à necessidade de garantir a segurança pública.”

“O preâmbulo da norma deixa claro que o legislador quis proibir a revista íntima apenas nos locais de trabalho, permitindo nos ambientes prisionais, embora com restrições", avalia. 

Hoffmann conta que no texto original havia um dispositivo que excluía os presídios desse impedimento, mas o conteúdo foi vetado. “O Executivo, em seu controle preventivo de constitucionalidade, quis evitar a edição de norma expressa autorizando a busca pessoal minuciosa nos presídios”, disse.

A advogada Maíra Fernandes, que foi presidente do Conselho Penitenciário do Rio de Janeiro, afirma que apesar de considerar a norma uma boa iniciativa, o importante é aprovar o Projeto de Lei 7.764/2014, que trata diretamente do tema. Ela vê o veto ao artigo 3º da Lei, que permitiria a revista íntima em presídios como um avanço, pois é uma maneira do legislador de evitar exceções.

“O artigo seria ilegal e inconstitucional por trazer uma diferenciação injustificável”, diz a advogada. Contudo, ela ainda vê possibilidade de a norma valer para os visitantes dos presos. “É algo que podemos tentar, não descarto de todo. Podemos tentar uma interpretação extensiva.”

Maíra destaca ainda que muitos estados e cidades têm leis, portarias ou decisões judiciais impedindo a revista íntima, entre eles Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraíba, São Paulo, Santa Catarina, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso Amazonas e Recife.

Ambiente de trabalho
O professor da USP Gustavo Garcia explica que, apesar de o empregador possuir o “poder de direção”, seu uso é limitado para coibir abusos, entre eles, a revista íntima. Ele cita o artigo 187 do Código Civil de 2002 e o artigo 8º, parágrafo único, da CLT, como mecanismos legais para inibir os excessos.

Lembrando que o entendimento também pode ser aplicado aos homens, ele explica que “a revista íntima, no caso, é a que viola justamente o direito de intimidade do empregado. Não se confunde, assim, com a revista pessoal, sem contato físico, como em bolsas e pertences do empregado, exercida de modo impessoal, generalizado e não abusivo, isto é, sem violar a intimidade do trabalhador”.

Entretanto, o advogado pondera que a Lei 13.271/2016, por ter alcance restrito às mulheres sem justificativa plausível, pode ter constitucionalidade discutida. “A norma legal não deveria restringir a proteção considerando o sexo da pessoa. Portanto, o mais adequado seria corrigir a apontada desigualdade, estendendo a proibição de revista íntima a todas as pessoas, independente do sexo.”

Fonte: Consultor Jurídico


- Apelação não impede internação imediata de menor infrator, decide 3ª Seção do STJ
Salvo decisão judicial em contrário, a internação de adolescente infrator deve ser cumprida imediatamente após a sentença que impôs a medida, mesmo que a defesa tenha entrado com apelação e que o menor haja respondido ao processo em liberdade na primeira instância. A decisão é da 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, que acompanhou por maioria o voto do ministro Rogerio Schietti Cruz.

“A medida socioeducativa não representa punição, mas mecanismo de proteção ao adolescente e à sociedade, de natureza pedagógica e ressocializadora”, afirmou o ministro, para quem a execução imediata não fere a regra segundo a qual “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” (artigo 5°, LVII, da Constituição).

O julgamento pacificou o entendimento sobre o tema nas duas turmas do STJ especializadas em matéria penal. O Habeas Corpus analisado tratava de um menor que praticou ato infracional equivalente a roubo com arma de fogo.

Proteção ao menor
Três ministros acompanharam a relatora, Maria Thereza de Assis Moura, e votaram pela concessão de ordem para que o adolescente aguardasse em liberdade o julgamento da apelação. Para a ministra, seria possível a execução imediata da medida socioeducativa, mas apenas se o adolescente já estivesse submetido a internação provisória, o que não ocorreu no caso.

Outros quatro membros da seção, no entanto, seguiram a posição divergente do ministro Rogerio Schietti e negaram o Habeas Corpus. Em seu voto, Schietti sustentou que as medidas socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente “não são penas e possuem o objetivo primordial de proteção dos direitos do adolescente, de modo a afastá-lo da conduta infracional e de uma situação de risco”.

Segundo ele, condicionar o início do cumprimento da medida ao trânsito em julgado da sentença, apenas pelo fato de que o menor não estava internado antes, “constitui verdadeiro obstáculo ao escopo ressocializador da intervenção estatal, além de permitir que o adolescente permaneça em situação de risco, exposto aos mesmos fatores que o levaram à prática infracional”.

Medida excepcional
Schietti observou ainda que, por lei, o processo não pode demorar mais do que 45 dias se o menor estiver submetido a internação provisória, o que normalmente leva o juiz a evitar essa medida cautelar e deixar para o final sua decisão sobre qual a medida socioeducativa mais adequada ao caso. Por essa razão, ele refutou a tese de que o cumprimento imediato da sentença só seria legítimo caso o menor já estivesse internado provisoriamente.

O ministro reconheceu que a internação, apesar de seu caráter ressocializador, implica cerceamento total da liberdade do jovem e pode ter reflexos negativos em sua formação, por isso deve ser reservada às situações de maior gravidade — como no caso julgado, em que o juiz apontou várias circunstâncias que recomendam a medida. 

Fonte: Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ/Revista Consultor Jurídico



- Me ne frego: a presunção de inocência apunhalada pelo STF

Autor: Salah Hassan Khaled Junior
Me ne frego é um lema fascista italiano. Seu significado pode ser traduzido como “pouco me importa”. A frase indica a necessidade de ir avante: a superação e o desdém pelos riscos, bem como a eleição do combate como valor que supera todos os demais. No fascismo não há lugar para os fracos e para a fraqueza. Não há sequer lugar para o indivíduo: o Estado é tudo. Ele representa o bem comum, que está acima dos interesses individuais.

Quando o Supremo Tribunal Federal relativizou a presunção de inocência com a decisão de 17 de fevereiro de 2016, fez mais do que apunhalar um direito fundamental: tristemente recepcionou um legado autoritário de processo penal, inadvertidamente ou não. Ao negar o HC 126.292, o STF decidiu pela possibilidade de cumprimento de sentença condenatória após o julgamento de apelação. A maioria dos ministros – em apertado placar de 7x4 – se deixou seduzir pela vontade de satisfazer a “opinião pública” e, de forma velada, disse que pouco importava se era necessário vulnerar direito fundamental para combater o mal, ou o que é percebido como manifestação do mal. Um trecho do voto do relator não deixa margem para dúvida: conforme o Ministro Teori Zavascki, é preciso “atender a valores caros não apenas aos acusados, mas também à sociedade”.

Por mais que o Ministro possa acreditar que de algum modo corresponde a anseios sociais ou atende à “vontade popular” – uma missão que certamente não lhe cabe –, a inaceitável argumentação de primazia de supostos direitos da sociedade sobre direitos individuais consiste em um dos núcleos do discurso autoritário. Ela literalmente produz uma espécie de cisão entre “bons” e “maus”: aceita que para os “inimigos” pode ser reservado um tratamento degradante, uma vez que supostamente representam uma ameaça para os demais. A forma com que esse ideal é recepcionado na releitura do STF é clara: foi (re?)afirmada uma distorcida presunção de culpabilidade que permite a execução antecipada de decisões condenatórias, ainda que exista recurso pendente para instâncias superiores. A conexão entre fundamento explicitado e solução adotada não deixa margem para dúvida: a segregação do acusado é percebida como um expediente necessário para a “segurança” da sociedade. A decisão simplesmente reescreve o art. 5.º, LVII, com atribuição violenta de sentido que ultrapassa completamente o limite interpretativo legal e constitucionalmente admissível: apunhala a presunção de inocência e “reinventa” o trânsito em julgado, em prejuízo do acusado.

O entendimento remete ao esplendor máximo da maquinaria inquisitória, cuja lógica era de gradação contínua e permanente de culpabilidade: não era possível que alguém fosse equivocadamente considerado objeto de suspeita e cada confirmação dos indícios originais no curso do processo fortalecia a “verdade” inicial. Cada etapa percorrida provocava alguma espécie de punição e consolidava a imagem preestabelecida, que sempre era confirmada no resultado final.

É preciso se acautelar contra devaneios autoritários. Não interessa se as aventuras são empreendidas em nome do “bem” e da “segurança”: o que importa é o potencial que os argumentos em questão representam para vulnerar a democracia e os direitos fundamentais que são inerentes a ela. Em pleno cenário democrático-constitucional, permanecemos reféns de um pensamento simplificador e binário, altamente capacitado para a destruição de vulneráveis. Em outras palavras, é espantoso constatar que o fascismo penetra no Supremo, Corte cuja tarefa maior deveria consistir na defesa incondicional de direitos fundamentais.

Existe uma história por trás do discurso que opõe a sociedade e seus inimigos. Ela conforma um legado autoritário que demonstra que o utilitarismo empregado em nome de um suposto “bem comum” é indissociável de regimes e propósitos autoritários. As intenções salvacionistas de defesa da “sociedade” de seus “inimigos” remetem literalmente a milhares de anos atrás. Propósitos supostamente nobres produziram incontáveis cadáveres ao longo dos últimos séculos de história: o extermínio massivo de indesejáveis decorreu diretamente do exercício verticalizado de um poder punitivo discursivamente justificado pela intenção de tutela do bem-estar social.

As sementes do tratamento diferenciado de inimigos podem ser encontradas em Roma, especificamente na Monarquia e no Império: com a cognitio e a cognitio extraordinem surgiram as bases do que viria a ser o processo inquisitório alguns séculos depois. Preservado pela Igreja após a queda do Império Romano, o aparato foi reintroduzido no século XIII para salvar o mundo do pecado, combatendo a heresia e assegurando o eventual triunfo da totalidade cristã, que não deixava margem alguma para a sobrevivência de quem era considerado desviante da “verdadeira” fé.

A Inquisição foi fundada precisamente com base na dicotomia entre a sociedade e seus inimigos, como pode ser percebido na obra de Nicolau Eymerich, oDirectorum Inquisitorum, que sistematiza os postulados do algoritmo inquisitório em um manual: “[...] é preciso lembrar que a finalidade mais importante do processo e da condenação à morte não é salvar a alma do acusado, mas buscar o bem comum e intimidar o povo (ut alii terreantur). Ora, o bem comum deve estar acima de quaisquer outras considerações sobre a caridade visando o bem de um indivíduo”.([1] ) Semelhantes ideias são esboçadas por Francisco Campos na Exposição de Motivos do Código de Processo Penal de 1941: “Urge que seja abolida a injustificável primazia do interesse do indivíduo sobre o da tutela social. Não se pode continuar a contemporizar com pseudodireitos individuais em prejuízo do bem comum”.([2] ) Discuti de forma aprofundada a relação entre os dois projetos político-criminais acima em minha tese de doutorado, publicada pela editora Atlas com o título de “A busca da verdade no processo penal: para além da ambição inquisitorial”.([3] )

A proximidade entre a dicotomia acima exposta e o trecho extraído do voto do Ministro Teori Zavascki é impressionante: horizontes antidemocráticos ganham ares de legitimidade com base em uma grosseira simplificação que autoriza uma cruzada contra as liberdades individuais em nome do bem-estar social. Por mais que possa soar sedutora a ideia, a história mostra o quanto é catastrófica a assunção dessas premissas.

Eu poderia convocar os mortos. Chamá-los para o diálogo e tentar ouvi-los, como fazia o grande historiador francês Michelet. Mas há uma alternativa melhor. Deixar que o próprio Vicenzo Manzini estruture boa parte do relato. Como orgulhoso herdeiro da tradição inquisitória e arquiteto dogmático do fascismo italiano, certamente ele é mais capacitado do que qualquer um para desvelar as entranhas de uma estrutura processual penal autoritária que literalmente se perpetua por milhares de anos sem qualquer sinal de esmorecimento. A proximidade entre a letalidade dogmática de Manzini e o “novo entendimento” do STF é facilmente perceptível, como procurarei demonstrar nos próximos parágrafos.

Todo projeto persecutório é anunciado como promessa de salvação. Sempre são construídas justificativas que remetem ao núcleo autoritário anteriormente referido. Sua serventia é visível: permite a legitimação do ilegitimável como urgente remédio para as mazelas do corpo social. Perceba como semelhante estrutura de pensamento também povoa o imaginário fascista de Manzini: para ele, o processo inquisitório se desenvolveu como verdadeira necessidade social, sobre a base do processo acusatório, conservando dele as formas que eram compatíveis com sua estrutura. Ele considera que o processo inquisitório oferecia melhores meios que o acusatório para uma eficaz repressão da delinquência e estava em maior conformidade com o espírito dos tempos e do regime que sucedeu às chamadas liberdades municipais.([4] ) O cenário retratado por Manzini relata a implementação da maquinaria inquisitorial de forma plenamente justificada: “imposto por evidente necessidade, o processo inquisitório prevaleceu sem discussão na prática italiana dos séculos seguintes, até o século XIX”.([5] )

Manzini considera que o processo inquisitório era mais minucioso, extenso e complexo que o acusatório.([6] ) Suas “vantagens” para o combate ao inimigo em nome do “bem comum” são inúmeras, como ele relata detalhadamente. O instituto da custódia preventiva não tinha uma disciplina fixa, ficando ao arbítrio do juiz, que procedia de acordo com a qualidade das pessoas, da gravidade do delito etc.([7] ) O interrogatório do acusado podia ser precedido ou seguido de tortura, que era inclusive empregada contra testemunhas reticentes ou suspeitas.([8] )

De fato, o engenho inquisitório era repleto de qualidades para expurgar o pecado do mundo: juntamente ao processo inquisitório formal foi introduzido um procedimento inquisitório sumário, para os casos em que a responsabilidade do imputado parecia evidentemente confirmada pelos resultados da inquisição geral.([9] ) Em tais casos o acusado era condenado sem realização de interrogatório, não sendo sequer admitida defesa.([10] ) O defensor era autorizado a atuar minimamente, sendo seriamente ameaçado caso se excedesse em sua função. Muitas vezes não havia sequer defesa se delito era punível com pena de detenção ou mais grave.([11] ) Esse procedimento foi aplicado rotineiramente aos delitos considerados gravíssimos – como os de lesa-majestade e heresia – e inclusive chegou a ser autorizado para todos os delitos.([12] )

Logicamente, Manzini não se contentou em expressar sua admiração pela arquitetura inquisitória. Literalmente reconstruiu seus postulados e estruturou uma lógica fascista de processo penal que não só é recepcionada irrestritamente pelo Estado Novo no Brasil como ainda povoa o imaginário fascista de nossos juristas, inclusive das mais altas cortes do país, aparentemente. Vejamos alguns de seus elementos centrais.

Manzini considera que o interesse fundamental que determina o processo penal é o de chegar à punibilidade do culpado, ou seja, de tornar realizável a pretensão punitiva do Estado contra o imputado, enquanto resulte ser culpado.([13] ) O sentido que Manzini atribui ao sistema penal é claro: o Estado tem o poder e o dever de realizar a pretensão punitiva derivada de um delito, para o qual está preordenado o processo penal.([14] ) Para ele, o processo penal é duplamente caracterizado como meio de tutela de interesse social de repressão da delinquência e meio de tutela de interesse individual e social de liberdade.([15] ) Mas Manzini é incisivo: o interesse de repressão da delinquência predomina sobre o interesse de liberdade: seu sentido está em fazer valer a pretensão punitiva do Estado através da imputação penal. Segundo ele, é equivocado dizer que as normas processuais penais são voltadas para a tutela da inocência, no sentido de que a inocência deve ser presumida enquanto a sentença condenatória não transitar em julgado; para o autor, a presunção de inocência não pode ser sustentada na ideia de que a obrigação de provar cabe ao acusador, pois a prova de delinquência pode ser obtida por iniciativa do juiz e a acusação já está provada em si mesma pelos indícios que a fundamentaram.([16] )

Manzini se orgulharia da decisão tomada pelo STF? É muito provável que sim. O Código Rocco de 1930 não consagrou a presunção de inocência, refletindo de forma programática o espírito fascista de seu tempo. Não há como negar que as ideias de Manzini eram condizentes com a Itália daquela época. E são suficientemente assustadoras, mesmo conectadas ao contexto que as originou. O que dizer então da decisão do STF? Me ne frego? Como no fascismo, devemos apostar no apoio das massas para autorizar o depósito massivo de seres humanos nos calabouços ilegais que chamamos de prisões, dando vazão ao nosso incontrolável ódio pelos que são tragados pelo sistema penal?

Creio que não. Não pode ser assim. Em última análise, é preciso fazer uma clara opção entre um processo acusatório e democrático, fundado na dignidade da pessoa humana – e, logo, na presunção de inocência –, e um processo de inspiração inquisitória e fascista, fundado na lógica de persecução ao inimigo.Infelizmente, o STF optou pelo último. Com essa lamentável decisão, nos distanciamos ainda mais da conformidade constitucional do processo penal: agredimos barbaramente um direito fundamental que é essencial para uma instrumentalidade que deve ser pautada pela intenção de redução de danos. O Brasil é um país ainda mais autoritário com essa surpreendente reviravolta de posicionamento. Não é dizer pouco. Lamento pelo Estado Democrático de Direito. O fascismo avança a cada dia. Perdemos a noção de limite. O STF reafirmou o legado autoritário do processo penal, não demonstrando o menor pudor em apunhalar direito fundamental sob a alegação de “estar ouvindo a sociedade”. O desprezo pela presunção de inocência é semelhante ao de Manzini, como acredito ter demonstrado. Mais um capítulo da trágica história que brevemente relatei foi escrito. Temo pelos próximos episódios, como devem temer todos que amam a democracia. O fascismo insiste em nos roubar a esperança. E sem ela é difícil (sobre)viver.

Salah Hassan Khaled Junior
Professor da Universidade Federal do Rio Grande – FURG.
Doutor em Ciências Criminais (PUCRS).

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