Algo profundamente tenebroso espreita entre as ruas mal iluminadas de uma cidade do continente europeu. Ao longo das margens enevoadas de um silencioso rio, ouvem-se gritos e sussurros que ecoam por todo local. Essas ruas mal iluminadas acompanhadas de perto pela névoa deste silencioso rio, ficam em uma cidade com cerca de 1,5 milhão de habitantes ao sul da Rússia. E é nesta cidade que o cheiro da morte é sentido como em nenhum outro lugar do mundo.
Alguns dizem que esta cidade é assombrada por espíritos malignos, já outros dizem que ela é parte de uma maldição que já dura mil anos, já outros apenas não tem explicação. O nome desta cidade? Rostov-on-Don. Por razões que nem a ciência, religião ou o oculto podem explicar satisfatoriamente, a cidade russa tornou-se o lar da fúria de um número extraordinariamente elevado de perversos criminosos. São psicopatas, serial killers, assassinos e estupradores que, por algum motivo, infestam a cidade. Entre 1987 e 1999, trinta e quatro serial killers foram presos vagando a procura de vítimas pela região. O dobro foram o número de estupradores capturados. Os números não mentem, portanto, não há dúvidas: na virada do século, Rostov ficou mundialmente conhecida como a capital mundial dos seriais killers, fato que rendeu os infames apelidos de “Cidade da Morte” e “Casa dos Maníacos”.
Mas por que Rostov? Embora a cidade tenha a reputação de ser a casa do crime organizado, Rostov não é uma cidade economicamente frágil, muito pelo contrário, e sua taxa de assassinatos em comparação com o resto da Rússia, é relativamente baixa.
“As pessoas aqui não são menos tementes a Deus do que em qualquer outro lugar. Por que Satanás escolhe muitos dos seus servos aqui é algo que está além de nossa compreensão,” disse o Padre Ambrosy, de uma Igreja Ortodoxa local, para uma reportagem da rede russa HTB.
Alguns moradores culpam a má influência dos primeiros povos de Rostov, os Cossacos, conhecidos pela fúria maldades ao colonizarem os povoados conquistados. Já outros, dizem que as condições sociais da cidade e a falta de oportunidades são os fatores que estão por trás do fenômeno. Entretanto, é um psiquiatra quem tem uma explicação mais reconfortante, mas antes de ouvi-la, deixe-me apresentá-lo.
Alexandr Bukhanovsky |
Em meados de 1984, o telefone tocou à meia-noite na casa onde o psiquiatra Alexandr Bukhanovsky estava hospedado na cidade de Rostov. O telefonema anunciava outra macabra descoberta. Bukhanovsky atende, era Viktor Burakov, e o psiquiatra, era a última esperança do investigador da polícia de Rostov.
Demorou exatamente 10 segundos para que Bukhanovsky soubesse que o menino sem os olhos, morto em uma floresta ao redor de uma estação de trem de Rostov, era mais uma vítima do serial killer chamado pela polícia de “O Estripador da Floresta”. O menino tinha dois buracos no lugar dos olhos, o assassino removera seus globos oculares e os levara com ele. “Marque-o como número 40″, disse Bukhanovsky para o investigador-chefe, o Tenente Viktor Burakov.
Vindo de uma família de médicos, Bukhanovsky foi um dos primeiros homens a se formar em psiquiatria por aquelas bandas. Ele sempre foi o tipo de profissional evitado por seus companheiros e negligenciado pelo seu próprio país. A União Soviética sempre negou a existência de cidadãos que pudessem ter desvios sexuais ou tendências psicopatas, por isso, quando ele se especializou em desvios sexuais e transsexualismo, imediatamente foi tachado de “a ovelha negra” da medicina. Sua vida mudou radicalmente em 1984, quando ele foi abordado por Viktor Burakov, investigador chefe da polícia de Rostov, que pediu-lhe para elaborar um perfil psicológico de um terrível serial killer que agia na região. Dez dias depois, Bukhanovsky produziu um relatório de sete páginas chocante para a época, muito devido ao seu aspecto sexual. O serial killer não era Jason Voorhees, mas um “homem de meia idade, educado, com um passado de molestamento infantil e problemas sexuais”. Sua análise alterou radicalmente a lista de suspeitos.
No início, a maioria dos investigadores da Força Tarefa que investigavam os assassinatos em série riram da ideia do chefe em chamar um psiquiatra para ajudar nas investigações, pior ainda era chamá-lo até uma cena de crime. Bukhanovsky, então aos 41 anos, não era bem vindo ali. Burakov peitou os seus superiores ao mesmo tempo em que outros policiais sentiam-se envergonhados com a ideia de um homem, cuja especialidade eram homossexuais e transsexuais, estar ali. Entretanto, foi este homem quem traçou o retrato do serial killer.
Quando o serial killer finalmente foi preso, mais uma vez, a polícia de Rostov recorreria a Bukhanovsky. “Sim, sou eu”, disse Andrei Romanovich Chikatilo ao psiquiatra quando este leu o seu perfil, escrito por ele anos antes. A seguir, O Estripador da Floresta Andrei Chikatilo confessou 56 assassinatos ao psiquiatra; crianças, adolescentes, adultos… o "grand finale" dessa terrível história pode ser interpretada como uma medalha de ouro ao renegado da medicina.
Mais de 20 anos depois da prisão de Andrei Romanovich Chikatilo, ninguém tem dúvidas da grande contribuição do psiquiatra em rastrear, possivelmente, o pior serial killer do século passado. E foi a partir da prisão de Andrei Chikatilo, em 1990, que Rostov viu crescer um número exagerado de serial killers, fazendo de Alexandr Bukhanovsky, claro, um homem muito, mas muito ocupado.
“Isso não tem nada a ver com o nosso abastecimento de água local”, brincou Bukhanovsky em um documentário da rede BBC, The Russian Cracker, transmitido em 1999. Não, não é o abastecimento de água, a influência dos cossacos ou as condições sociais de Rostov que fazem da cidade uma campeã em número de serial killers. Se condições sociais influenciassem no número de serial killers, imaginem o tanto que existiriam em cidades indianas? Ou em cidades da África? Até mesmo no Brasil, onde a condição social em estados pobres é uma das piores do mundo? Fora isso, especialistas, como Bukhanovsky, atentam para o fato de que muitos serial killers são homens estudados e muito bem sucedidos em suas profissões. O médico PhD Dr. Aleksey Sudarushkin não me deixa mentir.
“Assassinatos em série existem em toda Rússia, mas aqui, nós temos mais prática na captura deles e, portanto, as estatísticas são mais elevadas.”
Sábias as palavras de Bukhanovsky. Serial killers não são um fenômeno restrito a um local, raça ou gênero. Você acha que serial killer é coisa de americano? Você ficaria surpreso com o número desses assassinos na China… Complemento Bukhanovsky dizendo que assassinatos em série existem no mundo inteiro. O problema é que em determinados lugares, eles são levados a sério, portanto, existe uma falsa impressão de que esses assassinos ocorrem em maior número nestes lugares.
As autoridades de Rostov não poderiam deixar de se tornar experts em serial killers após um dos mais famosos casos de assassinatos em série da história. Por bem ou por mal, Andrei Chikatilo, e seus mais de 50 assassinatos, fez da polícia de Rostov uma das mais especializadas do mundo nesta área.
“Quando nós pegamos Chikatilo, já tínhamos uma ampla expertise nestes tipos de crimes. A maioria das outras forças policiais investigam tais crimes individualmente, sem ligá-los. E isso dá uma chance mínima para que o acusado seja pego, ao passo que nós, graças a Deus, temos pego todos os maníacos seriais desde 1991″, diz o experiente capitão da polícia de Rostov e veterano do caso Andrei Chikatilo, Anatoly Yevseyev.
Desde que Chikatilo foi preso em 1990, Bukhanovksy tratou 30 dos 34 serial killers pegos em Rostov, no período de 1987 a 1999. E o que ele aprendeu com eles?
O diagnóstico de Bukhanovsky é interessante, e quebra qualquer mito que vemos em Hollywood. Serial killers não querem matar, eles passam décadas resistindo ao ato de matar, ato que cresce ao longo dos anos e que é alimentada com cada frustração ou experiência negativa do indivíduo. Chikatilo, por exemplo, começou sua jornada molestando seus alunos na escola, e só começou a matar aos 42 anos de idade. A infância e/ou juventude também é um ponto chave, normalmente com um episódio que desperta suas perturbações.
Um exemplo é o sinistro serial killer Anatoly Slivko. Slivko esquartejou sete garotos vestidos de escoteiros entre 1964 e 1985. O uniforme de escoteiro era uma fixação do serial killer que, durante sua juventude, ejaculou ao assistir a uma horrível cena de um adolescente que vestia um uniforme de escoteiro e que foi esmagado em um acidente automobilístico.
“Um serial killer começa na infância. Um psicopata passa por diversas etapas antes que eles, literalmente, provem o sangue, e cada etapa é causada por diferentes pressões”, diz Bukhanovsky.
Após a prisão de Andrei Chikatilo, os métodos de Bukhanovsky foram rapidamente incorporados pela polícia de Rostov, e policiais de toda Rússia começaram a pedir por sua ajuda. Com os seus métodos, a polícia de Rostov tornou-se uma das mais especializadas no planeta em detectar assassinos e estupradores em série.
Tanto sucesso fez com que Bukhanovsky tentasse algo absolutamente ousado (e semi-ilegal), que extrapolou os limites da ética e colocou-o em um fogo cruzado com autoridades da cidade no final dos anos de 1990.
Bukhanovsky abriu uma clínica privada em Rostov, chamada Phoenix, e como um verdadeiro super-herói da vida real, começou um extraordinário plano para parar o número de assassinatos em Rostov. Enquanto assassinos e estupradores caminhavam pelas ruas da cidade, Bukhanovsky tentou encontrar alguma maneira de detê-los.
“Eu convidei uma dúzia de homens jovens da cidade que mostraram sintomas presentes em seriais killers”, disse Bukhanovsky para uma reportagem do Jornal inglês The Guardian em 1999.
Ele convenceu esses homens a participarem de um tratamento em sua clínica com a promessa de não contar à polícia. O objetivo de Bukhanovsky era tentar descobrir as origens da maldade nesses indivíduos e tratá-los de maneira que eles pudessem ter seus impulsos diminuídos ou, quem sabe, curados. Em 1999, ele começou a tratar um assassino, cujo assassinato ninguém sabia.
“Pela primeira vez na história da prática psiquiátrica, eu, um médico treinado, estou trabalhando com um assassino que está foragido. Eu poderia chamar a polícia, mas eticamente não tenho esse direito, porque ele confiou em mim. Talvez eu esteja errado de fazer isso, mas é para o interesse da ciência”, disse Bukhanovsky para uma reportagem da Revista New sweek em 1999.
O personagem em questão era um violento homem de 21 anos que foi levado à clínica de Bukhanovsky em Rostov por seus pais devido ao seu sociopático comportamento. Usando suas técnicas para extrair confissões de criminosos (sabemos que ele é um mestre nisso), o homem disse o seu terrível segredo: ele era um assassino. O jovem disse a Bukhanovsky que matou uma mulher durante uma noite de bebedeiras e sexo “sádico” e que havia torturado e espancado várias outras mulheres.
“Esse garoto é um clássico assassino em série no seu início. Nós o pegamos no momento em que ele começava a realizar suas fantasias”, disse Bukhanovsky.
O tratamento de Bukhanovsky, a base de drogas de contenção e psicoterapia, era sua fórmula para tentar “curar” tendências psicopatas. E foi esse tratamento que Bukhanovsky impôs ao“quase” serial killer. Acreditem ou não, o jovem não se tornou um serial killer e, apesar de uma tentativa de suicídio no início de 2000, o paciente de Bukhanovsky teve seus impulsos violentos diminuídos consideravelmente.
Outro paciente tratado por Bukhanovsky foi Edward. Edward descobriu que era necrófilo aos 11 anos de idade. E já nessa idade começou a desenterrar corpos de mulheres em cemitérios para fazer sexo. Um comportamento que, claramente, poderia levá-lo a se tornar um assassino em série. Ed Gein e tantos outros não me deixam mentir. Como muitos psicopatas, Edward tinha uma lesão cerebral.
“Na Rússia, há uma incidência muito grande de defeitos do cérebro devido aos partos particulares em aldeias isoladas”, diz Bukhanovsky.
Outro aprendiz de serial killer que frequentou a clínica de Bukhanovsky foi Igor. Igor tinha uma característica que Bukhanovsky encontrou nas dezenas de serial killers que tratou: o sentimento de humilhação.
“O assassino em série emergente não tem inteligência para lidar com um fator chave: a humilhação. Nunca se esqueça, a humilhação é a chave para desvendar por que homens matam repetidamente. Sem a minha ajuda, eles vão buscar vingança pela falta de poderes durante a infância”, diz Bukhanovsky.
Igor tem, talvez, as maiores orelhas da Rússia, orelhas as quais ele detesta, juntamente com o seu corpo esguio. Consequentemente, Igor, 22 anos na época em que começou a ser tratado por Bukhanovksy, ainda era virgem e possuía uma baixa auto-estima. Ele passou sua infância matando os animais de estimação da família. Como todos os pacientes de Bukhanovsky, Igor parece banal, muitas pessoas olhariam para ele e não dariam nada.
“Eu quero perseguir uma garota, mas ela deve ser bastante sexy. Eu colocaria clorofórmio em um pano molhado antes de estuprá-la, afinal, ela é uma vadia!”, disse ele a Bukhanovsky em um dos seus encontros.
Depois de dizer essa frase ao psiquiatra, Igor juntou os dedos das mãos, de forma a formar um cano de revólver, mirou o chão, e puxou o gatilho. Levantou a arma simulada para a boca e soprou as nuvens de fumaça.
“Mas o pior de todos é Misha”, diz Bukhanovsky.
Misha ilustra o quão longe Bukhanovsky foi (o psiquiatra faleceu em abril de 2013) com seus tratamentos. O jovem, de 22 anos, tinha três estupros nas costas. Em todos os casos ele torturou horrivelmente suas vítimas. Bukhanovsky diz que criminosos seriais raramente sentem pena, exceto por eles mesmos.
“Meu trabalho é ajudar o doente,” diz ele.
Entretanto, quem não gostou nada desses métodos de ocultação de Bukhanovsky foram as autoridades da cidade.
“Este paciente, que ele chama de Misha, estuprou várias mulheres, e isso é um crime e não deve ser escondido,” disse Amuhan Yandiev, Tenente-Chefe da polícia de Rostov, para a New sweek em 1999.
“Nenhum desses jovens têm reincidência nos últimos sete meses. É melhor do que tê-los lá fora, na cidade. Se pudermos entender o que está por trás da natureza irreprimível de matar, então nós vamos saber sobre as razões por trás de todos os níveis de crimes violentos”, defende-se Bukhanovsky.
Em 2000, autoridades de saúde de Rostov apresentaram uma queixa no tribunal da cidade criticando os métodos de Bukhanovsky. O psiquiatra respondeu dizendo que o seu trabalho com psicopatas locais era um grande serviço para a ciência e comunidade.
“Estamos lutando para encontrar as raízes da agressão social e estabelecer formas de controlá-la. Nós também tentamos divulgar o problema e incentivar as pessoas a se tratarem, ao invés de deixar a raiva crescer. Se eles souberem o que está acontecendo, eles não chegarão a matar”, disse o psiquiatra.
As críticas ao trabalho de Bukhanovsky foram engolidas pelos resultados do seu trabalho. Não há argumentos contra fatos, não é verdade? Grande parte dos seus pacientes tiveram seus impulsos errôneos diminuidos, para não dizer, desaparecidos. Um deles foi um pedófilo estuprador de meia-idade de nome Viktor. Oficial do exército, casado, e pai de uma filha de 11 anos, o pedófilo abusava da própria filha. Quando sua mulher descobriu, deu-lhe um ultimato: ou procurava um psiquiatra ou ela ia à polícia.
“O professor Bukhanovsky devolveu-me a vida novamente, hoje controlo meus impulsos. Se não fosse por ele, eu teria feito algo muito pior” , disse Viktor para a reportagem da New sweek.
É difícil culpar Bukhanovsky. Esses tipos de pessoas nunca deixarão de existir, portanto, o caminho mais lógico seria o de entendê-las e tratá-las, caminho o qual segue o psiquiatra. Entretanto, o que vemos é a demonização dessas pessoas e a crença de que elas merecem um tiro na testa, o que, claramente não adiantará, porque amanhã surgirá outro e depois outro…
A clínica de Bukhanovsky, Phoenix, em Rostov, distribui medicamentos e terapia para qualquer espécie de desviante; de pedófilos a pessoas que cometem incesto; até mesmo assassinos, como visto, são mantidos sob anonimato nos arquivos dos computadores da clínica. Os casos mais extremos são tratados gratuitamente, em parte através da compaixão do psiquiatra, mas também, para incentivar o sustento da base de investigação que ele precisa para continuar suas pesquisas.
Apesar das críticas, Bukhanovsky nunca foi processado ou reprimido pela polícia, poucos se arriscaram a reprimir seu trabalho, muito devido a fama de Bukhanovsky que, inclusive, ganhou uma honraria do governo russo pelo seu trabalho com serial killers, algo impensável em 1984, ano em que ele rascunhou as primeiras palavras sobre Andrei Chikatilo. Além do mais, as autoridades russas precisam de suas descobertas. A Rússia é um país com uma alta taxa de homicídios, 25 mil deles continuam inexplicáveis, e todos são creditados a assassinos em série. Em uma terra tão vasta, é fácil para maníacos matarem sem ser pegos. Assassinos canibais e assassinos seriais são muito comuns em todo o país, mas é em Rostov que eles não tem vez.
Bukhanovsky continuou seu trabalho com psicopatas, assassinos e seriais killers em sua clínica, a Phoenix, até 2013, ano em que faleceu. Sua filha Olga Bukhanovsky que, em 1999, foi escolhida como um dos 100 mais promissores psiquiatras jovens do mundo, durante uma competição promovida pela Associação Mundial de Psiquiatria em Hamburgo na Alemanha, atualmente é a presidente da clínica.
Em 1999, um interessante documentário, “Inside Story: The Russian Cracker”, sobre Bukhanovsky, foi ao ar pela rede BBC. O documentário mostrou o dia a dia de Bukhanovsky em sua clínica, inclusive com imagens de sessões de terapia com seus pacientes, destaque para sua conversa com o estuprador em série Misha.
Como dito acima, serial killers não são um fenômeno restrito a um local, raça ou gênero. Prova disso é que povos tão diferentes em seus modos de vida ou cultura, como os norte-americanos, russos, chineses e sul africanos, possuem uma taxa altíssima de incidência desses assassinos. E em Rostov, Bukhanovsky resolveu dar um singelo nome para o grande número de serial killers pegos na cidade após a captura de Andrei Chikatilo.
Andrei Chikatilo |
Após a prisão do “Açougueiro de Rostov”, uma verdadeira onda de assassinatos em série varreu Rostov e cidades adjacentes. O primeiro dessa onda de seriais killers foi preso ainda em 1989, ano em que Chikatilo ainda estava à solta, ele era Constantine Cheremukhin, “O Bárbaro”, que assassinou quatro adolescentes em Bataysk, uma cidade-satélite de Rostov. Pouco tempo depois foi a vez do “sucessor” de Chikatilo, Vladimir Muhankin espalhar o terror em Rostov. Ao ser preso, o “serial killer poeta” entregou 18 cadernos de poesias as autoridades de Rostov.
“A Besta de Taganrog” e seu fetiche por meias-calças pretas, Viktor Kuchmiy, “O Animal”, Alexander Krasnokutskiy, “O Matador de Senhoras”, e Andrei Seleznev, “O Eletricista”, foram outros que apareceram no rastro de Andrei Chikatilo e cujas histórias inundaram os tablóides de notícias russos. Posso dizer que após a prisão de Chikatilo, o que mais se via em TVs russas eram homens com os cabelos raspados dentro de jaulas de ferro sendo julgados pelo tribunal de Rostov.
Abaixo vocês irão ver alguns deles…
Constantine Cheremukhin é conhecido como o “Estripador da Floresta”. Cheremukhin atacou na mesma época em que Andrei Chikatilo vagava por Rostov e regiões em busca de vítimas. Duas vítimas de Cheremukhin, inclusive, foram confundidas por alguns investigadores do caso Estripador da Floresta como vítimas de Chikatilo. Assim como Chikatilo, Cheremukhin cortava os seios e os órgãos genitais de suas vítimas mulheres.
Nascido no final dos anos 30, Constantino Cheremukhin, assim como Chikatilo, pertenceu a geração das “crianças da guerra”, e passou por todas as dificuldades que uma guerra pode trazer. Fascinado por tecnologia, seu sonho na adolescência era ter uma moto, desejo que logo se estendeu a um carro. Ter um carro na pobre sociedade soviética da década de 1960 era sinônimo de status e riqueza. Não podendo ter um, Cheremukhin decidiu entrar para o mundo do crime. Sua primeira prisão aconteceu devido ao roubo de um carro. Contribuiu também para a sua vida criminosa a descoberta de que o seu pai, na verdade, não era o seu pai biológico. O homem que o criou, e que ele acreditava ser o seu pai, era estéril. Sua mãe o tivera com um dos seus amantes, descoberta que o fez despertar ódio pelas mulheres.
Mas o ódio contras mulheres não o impediu de casar com uma que conheceu na prisão. Decidido a se ajustar na vida, ele começou a trabalhar e mudou-se com sua esposa para a cidade de Bataysk. Pelo seu empenho, ganhou um carro da família, um belo Lada. E é com este mesmo Lada que Cheremukhin andava pelas ruas de Bataysk em busca de vítimas; meninas na pré-adolescência. Uma foi afogada, outra estrangulada, outra morta com uma chave de fenda…
quatro mortes no total. Bukhanovsky o examinou em 1989, ano de sua detenção, e considerou-o são. Constantine Cheremukhin, “O Bárbaro”, foi executado em 1993 com um tiro atrás de sua orelha direita.
O ano de 1990 foi bastante movimentado para a polícia de Rostov. Desesperados pela onde de crimes de um serial killer conhecido como O Estripador da Floresta, eles ainda tiveram que lidar com um outro serial killer, que estava cometendo bizarros assassinatos em Taganrog, uma das cidades satélites de Rostov-on-Don.
No início de 1990, o corpo de uma jovem mulher foi encontrado queimado dentro de sua própria casa. Ela estava amarrada e o médico legista concluiu que ela sofrera violência sexual e fora estrangulada. Em 13 de maio de 1990, foi a vez do corpo de uma estudante de 16 anos, Anna Linerberger, ser encontrado em um beco próximo a sua casa. Ela havia sido espancada, estuprada e estrangulada com sua própria blusa. Seu corpo nu, estava vestido apenas com uma meia-calça preta.
Duas semanas depois, Irene Revyakin, 15 anos, foi encontrada morta num terreno baldio perto de sua casa. Mais uma vez, o corpo nu estava vestido apenas com uma meia-calça preta. Parecia que a meia-calça preta era a assinatura de um serial killer.
Em setembro de 1990, Olga Kudimova, 20 anos, foi estuprada e morta perto de uma fábrica. Mais uma vez, meias-calças pretas estavam vestidas no cadáver nu. Após o quarto assassinato, o serial killer parou, mas voltou em 1992, quando fez sua quinta vítima, Olga Novikova. Bukhanovsky chegou a traçar um perfil psicológico da “Besta de Taganrog”, e dentre outras coisas, disse que o serial killer era um fetichista que obtinha prazer sexual ao colocar meias-calças pretas nas vítimas. Segundo Bukhanovsky, ele também poderia estrangulá-las com a mesma meia-calça.
Apesar do trabalho de Bukhanovsky, foi o serial killer quem cometeu um erro e facilitou o trabalho da polícia. Um detetive andava pela periferia de Taganrog quando percebeu vários homens espancando um outro. Ao aproximar-se, os homens lhe disseram que aquele homem ali caído no chão tentara puxar uma garota para um beco e esta começou a gritar histericamente. Era o fim para a Besta de Taganrog.
Ele era Yuri Leonidovich Tsyuman, 23 anos. Vindo de um lar violento, Yuri viveu na pobreza e era constantemente abusado pelos pais, dois alcoólatras crônicos. Sentia muita vergonha perante os vizinhos devido aos inúmeros escândalos dos seus pais. Apanhava do pai e era ameaçado de morte por sua mãe, caso a desrespeitasse. Pior do que isso foi o fato da sua mãe levar homens para casa e fazer sexo com eles na sua frente, durante a época em que seu pai estava preso por roubo.
Não nos surpreenderia que Yuri Tsyuman crescesse um homem paranóico e agressivo, principalmente quando ele tomava contato com algo muito comum entre os russos: a vodka. Devido à sua instabilidade psicológica, teve uma primeira experiência sexual desastrosa, fato que o acompanhou por toda sua vida. Yuri gostava bastante de filmes de terror, não perdia um, seus filmes prediletos eram os de maníacos assassinos, e isso foi algo que contribuiu negativamente para o que viria a seguir.
Após sua prisão, ele disse a Bukhanovsky que:
“Eu queria uma mulher, estuprada e morta. A manipulação das meias era um fator estimulante, as pernas das mulheres ficavam mais atraentes com as meias-calças. Quando ela estava morta, emoção e raiva diminuíam, sentia alívio.”
Yuri Tsyuman tentou simular que era insano, mas Bukhanovsky o considerou são, e mesmo mostrando arrependimento e pedindo misericórdia, ele foi condenado a morte. A pena foi comutada para prisão perpétua e ele atualmente está na prisão de Novocherkassk, a mesma onde Andrei Chikatilo, Anatoly Slivko, Constantine Cheremukhin e tantos outros seriais killers da região foram executados. Num programa de TV da rede russa HTB, em 2005, ele disse:
“É melhor a morte do que uma sentença de vida.”
Nascido em 22 de abril de 1960, Vladimir Anatolyevich Muhankin assustou Rostov em meados dos anos de 1990. Vindo de um lar esfigurado, sofreu abusos e desde cedo mostrou um comportamento criminoso. Como muitos psicopatas seriais killers, começou torturando animais na infância. Gostava de esfaquear gatos e galinhas. Também gostava de espancar cavalos e vacas. Ao entrar na adolescência começou a praticar pequenos furtos e ficava dias nas ruas. Nos seus primeiros 35 anos de vida, passou 18 anos na cadeia.
Em 1995, após passar uma temporada na prisão, começou uma onda macabra de assassinatos. Em dois meses, assassinou sete mulheres e um homem (algumas fontes dizem 11 mulheres e 1 homem). Gostava de dissecar os corpos de suas vítimas e muitas vezes dormia em sua cama com os órgãos retirados dos cadáveres. Em algumas ocasiões, deixava poemas nos locais dos crimes. O trecho de um pode ser lido abaixo:
“Aparecendo no céu, a lua é jovem,
As corujas choram em algum lugar,
Depois de dar à luz,
Você sempre levará alegria na vida,
Mas há sofrimento no mundo …”
Muhankin foi preso depois que uma vítima conseguiu escapar. Durante os interrogatórios, o serial killer se comportava de maneira provocativa, não expressou nenhum remorso por seus crimes e chegou a dizer que era um “discípulo de Chikatilo”. Mas ao mesmo tempo que dizia ser um discípulo do maior serial killer da história da Rússia, Muhankin dizia que Chikatilo era um “frango” perto dele. Seus crimes eram um reflexo do ódio que ele sentia por sua mãe. Ao matar mulheres, era o mesmo que matá-la.
O erro do serial killer ucraniano Vladimir Vasilevich Krishtopa foi se estabelecer em Rostov após fugir da Ucrânia após cometer quatro assassinatos em série. Ele não sabia, mas foi direto para as mãos de uma das mais especializadas polícias no mundo no que diz respeito a serial killers. E mesmo assim, ele ainda conseguiu cometer dois assassinatos em Rostov, antes de ser pego tentando matar a terceira.
Vindo de uma família de pais carinhosos e presentes, Krishtopa viveu uma vida de classe média na Ucrânia, tocava guitarra e parecia destinado a uma brilhante carreira na medicina, área a qual seus pais fizeram carreira. Mas havia algo de errado com ele, e ninguém percebeu isso. Como muitos seriais killers, para espantar os seus pensamentos, começou a beber. E foi embriagado que ele cometeu os seus seis assassinatos.
Após estuprar, torturar e assassinar quatro mulheres na Ucrânia, ele se estabeleceu em Rostov. Em 17 de junho de 1995, assassinou sua quinta vítima. Um mês depois, a sexta. A casa caiu para o maníaco quando, em 06 de agosto de 1995, ele foi preso em flagrante tentando assassinar sua terceira vítima em Rostov.
Bukhanovsky o considerou são e o tribunal de Rostov condenou-o a morte, pena que posteriormente foi comutada para prisão perpétua. Em 2005, um documentário da rede de TV russa HTB intitulado “O Nascimento de um Maníaco” , o entrevistou na prisão.
“Ele entrou dentro de mim. Eu sei que se eu tivesse conhecido Bukhanovsky antes, teria sido curado. Estou 100 por cento certo disso”, disse ele sobre o psiquiatra Alexander Bukhanovsky.
Sobre seus crimes, Krishtopa coloca a culpa na bebida. “Mas eu bebi uma garrafa de vodka antes do meu primeiro assassinato, e então eu estrangulei minha vítima com uma jaqueta da Reebok” , diz ele.
No documentário, Bukhanovsky diz que muitos seriais killers bebem como uma forma de facilitar o assassinato.
“Você esquece que um assassino, muitas vezes, está num estado de embriaguez. Ele precisa matar em uma posição de esquecimento para sua alegria plena, imaculada por dúvidas morais. Ele é um senhor de um escravo. Ele não considera a vítima como um indivíduo. Assassinos múltiplos sentem uma relaxante e enorme tensão após o ato de matar, e isso cria uma auto-crença de que isso é necessário. Até mesmo serial killers tem um tipo de hierarquia e contorcidos limites morais”, diz Bukhanovsky.
“Diga a minha mãe e ao meu pai que eu os amo. Você sabe, ambos são médicos e eu não posso desfazer sua dor”, diz Krishtopa para o repórter ao fim de sua entrevista.
Kamensk é uma cidade pertencente a região de Rostov Oblast, e fica ao norte de Rostov-on-Don. Em 1993, estranhos desaparecimentos de crianças intrigaram as autoridades da região. Em setembro daquele ano, os irmaos Churilov Eugene, 12 anos, e Olesya Eugene, 7 anos, desapareceram sem deixar rastros. Uma grande investigação foi feita, mas nenhum vestígio dos irmãos foi descoberto. No dia em que o italiano Roberto Baggio errava um pênalti e o Brasil ganhava a Copa do Mundo dos Estados Unidos, 17 de julho de 1994, a adolescente Marina Alekseey, 12 anos, desaparecia. Quase um ano depois, em 23 de maio de 1995, foi a vez de Anya Kulinkinu, 09 anos, desaparecer. Passou-se mais um ano e, em julho de 1996, duas outras crianças desapareceram de Kamensky.
As investigações da polícia sobre os desaparecimentos eram complexas já que não haviam testemunhas. As crianças simplesmente desapareceram. A inteligência policial acreditava que elas poderiam ter sido vítimas de um maníaco, um serial killer, mas como ter certeza se nenhum corpo era encontrado?
As dúvidas foram sanadas no dia 20 de novembro de 1996 quando um pacato funcionário de uma fábrica da cidade, Roman Vladimirovich Burtsev, 25 anos, foi preso. Com muito custo, ele confessou o assassinato de seis crianças entre 1993 e 1996. Burtsev estuprava, torturava e asfixiava suas vítimas. Cuidadoso, ele enterrava as vítimas para que não fossem encontradas, mas cometeu um erro ao enterrar numa cova rasa sua última vítima. O corpo de Natasha Kirbabinoy, foi encontrado numa floresta e testemunhas lembraram de um jovem numa bicicleta que havia pedido uma pá emprestada.
Como muitos seriais killers, Burtsev era um homem acima de qualquer suspeita. Vindo de uma família aparentemente normal, era casado, não bebia, não fumava e tinha um currículo limpo na escola e exército. Mas por dentro tinha um mórbido interesse em crianças.
Alexandr Bukhanovsky o examinou e concluiu que Burtsev não sofria de doença mental, tampouco demência. No momento dos crimes, Burtsev não tinha qualquer anormalidade que afetasse sua capacidade de avaliar o que estava fazendo, ou seja, ele estava plenamente consciente dos seus atos e podia controlá-los. Como muitos seriais killers, Burtsev tinha complexo de inferioridade e a falta de carinho e amor durante sua infância criou uma espécie de ressentimento que o fez querer vingar de crianças.
Em 1997, Roman Vladimirovich Burtsev foi condenado à morte pelo tribunal de Rostov. Pena que mais tarde foi comutada para prisão perpétua.
O caso de Igor Elizarov é muito interessante. Interessante porque, em sua infância, Igor foi um paciente do psiquiatra Alexander Bukhanovsky. Igor interrompeu o seu tratamento e, ao ficar adulto, tornou-se um serial killer.
* Não confunda Igor Elizarov com o “Igor orelhudo” citado anteriormente.
Igor Elizarov nasceu em 1979 e viveu toda sua vida em Rostov. Qual a brincadeira preferida do pequeno Igor quando criança? Matar e mutilar seus animais de estimação. Gatinhos, cachorros e os seus preferidos, os ouriços.
Ele gostava de empalá-los. Aos 12 anos, sua mãe ficou em estado de choque quando o pegou matando um gato e se masturbando ao mesmo tempo. Ela, claro, o levou a um psiquiatra. Quem? Alexander Bukhanovsky. Nessa época, 1992, Bukhanovsky já era nacionalmente conhecido pelo seu trabalho no caso Andrei Chikatilo, e a sua clínica era a única na Rússia a tratar de pessoas com problemas graves de saúde mental.
E Bukhanovsky conseguiu extrair os mais perversos desejos do garoto. Para o psiquiatra, Igor disse que tinha um desejo enorme em matar pessoas.
“Ele era acompanhado por dois especialistas, uma psiquiatra infantil e um psicoterapeuta. Ele era um excelente paciente, muito inteligente”, disse Bukhanovsky sobre Igor.
Sabendo do seu diagnóstico, Igor começou a estudar toda literatura disponível sobre psicopatas e serial killers. Certa vez, disse a Bukhanovsky sobre o seu medo de torna-se um deles. Com seu comportamento aparentemente sob controle, Igor decidiu abandonar o tratamento na Phoenix. Era o começo do seu fim.
Colocou fogo em várias lojas de Rostov, um comportamento comum a muitos serial killers, e tentou organizar um acidente ferroviário colocando pedras nos trilhos de um trem. Além disso, Igor começou a frequentar cemitérios da região e tinha prazer em acompanhar o funeral de mulheres.
Logo, ele passou para o passo seguinte. Não satisfeito em acompanhar os funerais, Igor começou a cavar as covas das mulheres recém enterradas para se masturbar em cima dos cadáveres. Ele voltou para a Phoenix e experimentou uma melhora.
Deixou de ter um comportamento antissocial, formou-se em economia e até namorou sério com uma garota. Pensando estar bem, Igor mais uma vez decidiu largar seu tratamento e as drogas que usava.
Sua namorada o deixou e ele decidiu não trabalhar com economia, mas em outra área. Qual área? Funcionário de necrotério. Claro, assim ele poderia ficar mais perto de cadáveres. Começou a roubar dinheiro do necrotério e passou a beber vodka para espantar seus diabólicos pensamentos. E como muitos serial killers, ele estava bêbado quando assassinou sua primeira vítima, um mendigo bêbado que ele encontrou num cemitério de Rostov.
Um ano depois, ele estuprou e estrangulou um menino de cinco anos. Não preciso dizer que ele fez sexo com o cadáver do garoto. Mais um tempo depois e ele assassinou outra criança de 06 anos.
“Ele matava pessoas aleatórias para efeitos de necrofilia”, disse um trecho do processo do tribunal de Rostov.
O homem calmo e muito inteligente, surpreendeu o Juiz de Rostov, Boris Grigoriev. Por questões éticas, Bukhanovsky não entrevistou seu ex-paciente e outro psiquiatra considerou-o são, mas com transtorno de personalidade. Igor foi condenado a 15 anos de prisão.
“Por natureza, Igor Elizarov era um assassino. As pessoas acreditam que o diagnóstico de transtornos mentais típicos, como os presentes em serial killers, só podem ser diagnosticados em adultos. Isto é fundamentalmente errado. Serial killers e maníacos vem desde a infância. A doença começa quando há cruéis fantasias sádicas que ao longo do tempo tornam-se mais e mais violentas. Igor Elizarov é um exemplo de como um maníaco serial killer pode começar seu caminho sangrento desde muito cedo. Infelizmente, nossos estudos sobre essas pessoas ainda estão no início. Uma vez, em um programa de televisão, me perguntaram: ‘Quanto tempo você trabalhará com serial killers para saber como curá-los?’ Honestamente eu respondi: ‘Não sei’.” (Alexandr Bukhanovsky)