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sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

Serial Killer Parte XII - Assassinos em Série na Justiça Brasileira



O Brasil infelizmente é conhecido por possuir um Sistema Penal sucateado e falho; que não funciona no sentido de obter justiça, e sim no sentido de ir de acordo com os interesses de políticos e de outros detentores do poder.

Pensando na questão do Assassino em Série aqui no Brasil, será o Sistema Jurídico Penal brasileiro está preparado para esse tipo de criminoso? Será que existe uma boa formação profissional para aqueles que trabalham na área criminal como um todo?


O número desses criminosos vem crescendo cada vez mais pelo mundo a fora, principalmente nos Estados Unidos da América. O Brasil também tem demonstrado vários casos envolvendo assassinatos em série, sendo de grande preocupação pois a sociedade se encontra desprotegida desses indivíduos.

No Brasil, segundo Ilana Casoy (2004), a polícia tem um grande preconceito em aceitar a possibilidade de um Serial Killer estar em ação. A autora critica ainda, o fato de que os órgãos especializados em Ciências Forenses existentes no Brasil serem pouco incentivados e divulgados, pois ao lidar com crimes em série, o trabalho integrado de profissionais forenses deveria ser obrigatório. Ou seja, se existe a dificuldade de aceitar tal fato, é inegável que existe pouco entendimento sobre o assunto. Portanto, o homicídio em série, sem dúvida é um dos crimes que mais geram polêmica visto a conduta violenta e peculiar do agente. 

Estudos baseados em crime e psicopatia, realizados pelo psicólogo canadense Robert Hare (1980), culminaram na elaboração de um método denominado PCL-R (psychopathy checklist revised – 1991), para identificação de psicopatas em populações prisionais, também conhecido como Escala Hare.

Em relação a características de personalidade, em um estudo conduzido por Stone, 86,5% dos serial killers preenchiam os critérios de Hare para psicopatia, sendo que um adicional de 9% exibiu apenas alguns traços psicopáticos, mas não o suficiente para alcançar o nível de psicopatia. 

No Brasil, essa escala foi traduzida, adaptada e validada pela psiquiatra forense Hilda Morana (2003), sendo utilizada com sucesso por psicólogos e psiquiatras forenses no diagnóstico e avaliação da psicopatia, constituindo uma ajuda técnica para que magistrados possam adotar medidas legais com mais segurança em suas decisões.

Variações do padrão de comportamento considerado normal, mas que não alcançam a condição de doença mental propriamente dita, são condições que demandam atenção especial nas questões forenses.

O criminoso psicopata possui um transtorno de personalidade, no caso denominado como Transtorno de Personalidade Antissocial. Na psiquiatria forense, esse transtorno é considerado uma perturbação da saúde mental, e não doença mental, envolvendo “a desarmonia da afetividade e da excitabilidade com integração deficitária dos impulsos, das atitudes e das condutas, manifestando-se no relacionamento interpessoal”.

Da mesma forma, Valença, Chalub e outros (2005) entendem que os criminosos psicopatas possuem um transtorno de personalidade, o que configura perturbação da saúde mental. No entanto, diferentemente da doutrina psiquiátrica, denominam estes como 'fronteiriços', pois, situados na zona limítrofe entre a doença mental e a normalidade psíquica, não tendo capacidade de comportar-se por falta de controle de seus impulsos, embora entendam o caráter criminoso de seus atos.

De fato, poucos serial killers sofrem de doenças mentais em uma extensão debilitante suficiente para serem considerados loucos pelo sistema de justiça criminal.

Greco (2011) conclui que, não basta o diagnóstico de doença mental para que o autor de crime seja considerado inimputável, mas também que, no momento da ação, este seja inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Não encontramos no Código Penal um conceito para a imputabilidade ficando, portanto, à cargo da doutrina fazê-lo. 

Fernando Capez (2011) a conceitua a imputabilidade como “a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento”, um dos conceitos mais clássicos que temos. A imputabilidade possui dois elementos, o primeiro é o discernimento do agente em entender que o fato que esta sendo praticado é contrário ao ordenamento jurídico, o segundo consubstancia-se na capacidade de agir de acordo com essa compreensão.

Diferente da época de Lombroso, nos dias atuais o ser humano é visto como um ser biopsicossocial; levando isso em conta a doutrina penalista estabelece três sistemas ou métodos que explicam a imputabilidade, são eles:

Sistema biológico ou etiológico: Leva em conta a doença mental, isto é, o estado anormal do agente. Este sistema é de inspiração francesa e considera a inimputabilidade apenas do ponto de vista das causas biológicas. Dessa maneira, ele peca em não indagar se essa anomalia causou alguma perturbação que limitou a inteligência ou a vontade do agente, deixando impune aquele que, embora portador de doença mental, possua discernimento e capacidade de determinação.

Sistema psicológico: este sistema tem em conta apenas as condições psicológicas do agente à época do fato. Aqui, não há necessidade de demonstração de insanidade mental ou de distúrbio psíquico patológico. Trata-se de um critério pouco cientifico e de difícil averiguação.

Sistema biopsicológico: é um sistema híbrido, misto, uma combinação dos dois sistemas anteriores. Exige, de um lado, a presença de anomalias mentais, e de outro, a completa incapacidade de entendimento. Dessa forma, o agente só será considerado inimputável se em função de enfermidade ou retardamento mental era, no momento da ação, incapaz de entender o caráter criminoso do fato e de se comportar conforme essa compreensão.

O Código Penal brasileiro adotou esse terceiro sistema, sendo a imputabilidade excluída, e em conseqüência a culpabilidade, em razão de doença mental e desenvolvimento mental incompleto ou retardado (art. 26), menoridade penal (que nada mais é do que um desenvolvimento mental incompleto presumido) e a embriaguez fortuita completa (art. 28, parágrafo primeiro).

Pelo direito penal brasileiro, os psicopatas são considerados, em regra, semi-imputáveis. Entretanto, temos casos na jurisprudência em que foram enquadrados como imputáveis, distinguindo-se, portanto, apenas o quantum da pena aplicada – os primeiros a tem a pena reduzida por determinação legal.

Trindade, Beheregaray e Cuneo (2009) esclarecem que a semi-imputabilidade, como concebida pela esfera jurídica, aplica-se somente quando os fatos criminais se devem, de modo inequívoco, a comprometimento parcial do entendimento e da autodeterminação de seu autor, o que não ocorre nos delitos cometidos por psicopatas:

(…) verifica-se pleno entendimento do caráter ilícito dos atos e a conduta está orientada por esse entendimento (premeditação, escolha de ocasião propícia para os atos ilícitos, deliberação consciente e conduta sistemática). Portanto, do ponto de vista psicológico-legal, psicopatas devem ser considerados imputáveis.

Para esses especialistas, os psicopatas possuem tanto sua capacidade cognitiva como volitiva preservadas, o que, de modo nenhum, se encaixa na condição de semi-imputável:

Psicopatas têm noção da natureza de seus atos e conhecem as normas sociais, tanto assim que não atuam sob a ameaça de serem descobertos. Possuem vontade dirigida finalisticamente a um resultado, e essa vontade deve ser censurada porque eles são plenamente conscientes da ilicitude de seus atos.

(…) o psicopata atua com juízo crítico de seus atos e revela-se muito mais perigoso do que o criminoso comum, devido à sua habilidade em manipular e de se apresentar de forma sedutora, valendo-se de múltiplos recursos para enganar suas vítimas. Ele escolhe, reflete, decide e executa. Esse conjunto circunstancial faz com que o ato não seja meramente impulsivo, mas planejado e desejado. (...)

Apesar dessas considerações, a jurisprudência entende prejudicada a capacidade volitiva do indivíduo, persistindo em sua condição jurídica de semi-imputável, como as seguintes decisões trazidas à baila:

“A personalidade psicopática revela-se pelas perturbações da conduta e não como enfermidade psíquica. Destarte, embora não enfermo mental, é o indivíduo portador de anomalia psíquica, que se manifesta quando do seu procedimento violento, ao cometer o crime, justificando, de um lado, a redução da pena, dada a semi-responsabilidade; e, de ouro, a imposição, por imperativo legal, da medida de segurança”. (TJSP – Rev. Crim – Relator Des. Adriano Marrey – TR 442/412).

“A personalidade psicopática não se inclui na categoria das moléstias mentais acarretadoras de irresponsabilidade do agente. Inscreve-se no elenco das perturbações de saúde mental, em sentido estrito, determinantes da redução da pena”. (TJMT – Ap. Crim – Relator Des. Costa Lima – RT 462/409).

“Personalidade psicopática não significa, necessariamente, que o agente sofre de moléstia mental, embora o coloque na região fronteiriça de transição entre o psiquismo normal e as psicoses funcionais”. (TJSP – Ap. Crim – Relator Des. Adriano Marrey. TR 495/304)

A psicopatia, de acordo com os especialistas da área de saúde mental, classifica-se como 'doença moral', devido sua destrutividade social e relacional, bem como, sua força predatória. Não são psicóticos – como os portadores de esquizofrenia – nem sofrem de déficit de inteligência – como os que possuem atraso ou retardo mental.

Nucci (2005) entende que as anomalias psíquicas apresentadas pelos indivíduos portadores de transtorno de personalidade antissocial “não excluem a culpabilidade, pois não afetam a inteligência, a razão, nem alteram a vontade”.

O diagnóstico do assassino em série como psicopata acompanhado pelo correto enquadramento deste como hígido mental, portador de plenas capacidades mentais, são questões cruciais para a adoção de medidas jurídicas adequadas para esses indivíduos que, como veremos a seguir, são incapazes de aprender com suas experiências.

Trindade e outros (2009), considerando, além de sua experiência na área, estudos realizados por outros especialistas, relatam uma série de características que identificam a pouca probabilidade de “cura” para o psicopata, e até mesmo a possibilidade de um efeito inverso:

→ como não se importam com as consequências de seus atos, seu comportamento antissocial não é contido pelo medo da punição, aliás, sequer tem esse sentimento – medo;

→ são denominados egossintônicos, ou seja, incapazes de sentir desconforto interno e, portanto, não se sentem impelidos a fazer mudanças;

→ algumas terapias podem fornecer ao psicopata um aprimoramento na sua técnica de manipular, iludir, enganar e aproveitar-se dos outros, agravando a situação que se pretende melhorar;

→ para a eficácia da terapia, é necessário que haja um vínculo emocional entre terapeuta e paciente, mútua cooperação e sinceridade: psicopatas não atendem as estes critérios.

→ por não se intimidarem com a severidade do castigo e nem aprenderem com a experiência, mostra-se ineficaz a aplicação de medidas meramente punitivas e dissuasórias, o que tem relação direta com o sistema penitenciário.

Na legislação brasileira, a semi-imputabilidade faculta ao juiz diminuir a pena ou enviar o réu a um hospital para tratamento, caso haja recomendação médica de especial tratamento curativo.

A medida de segurança para realizar especial tratamento curativo é, por sua vez, bastante polêmica, devido à grande dificuldade de se tratar de forma eficaz os portadores de transtorno anti-social. Outro ponto merecedor de questionamento é a aplicação de um regime de tratamento hospitalar ou ambulatorial na dependência do tipo de punição previsto para o crime praticado, ao invés de depender do quadro médico-psiquiátrico apresentado.

Na esfera cível, apesar de existirem várias outras solicitações, o exame psiquiátrico mais comumente realizado no Brasil é aquele para fins de interdição, em que se avalia a capacidade do indivíduo de reger sua própria pessoa e administrar seus bens. A maioria dos portadores de transtorno de personalidade anti-social não sofre qualquer intervenção judicial. No entanto, casos mais graves podem gerar uma interdição parcial.

Chegamos à conclusão de que o assassino em série psicopata não possui tratamento adequado em nosso sistema penitenciário brasileiro. O que temos apenas são profissionais sem o mínimo de preparo para esse tipo de situação, uma justiça do ‘meio-termo’ e um sistema carcerário ineficaz e falido que não regenera ninguém, muito menos um indivíduo que tem personalidade antissocial. Isso nos leva a formular a convicção de que não há no Brasil um julgamento adequado ao assassino serial e também não há uma previsão positiva sobre uma possível mudança de quadro, já que um dos nossos maiores empecilhos está na retrógrada Constituição Federal de 1988.

Também não pretendemos ingressar na seara médica, porém, convém mencionar que ainda não encontraram métodos adequados e eficazes de tratamento para os serial killers – o que não significa que não exista tratamento


Bibliografia:

MOURA, Bruna Toniolo; Faculdades Integradas Antonio Eufrásio de Toledo. A imputabilidade dos Assassinos em Série.2010

Breves Considerações acerca da Imputabilidade dos Assassinos em Série: http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=6284#_ftn5


A aplicabilidade da lei penal aos serial killers brasileiros: aspectos jurídicos do assassinato em série: https://jus.com.br/artigos/51629/a-aplicabilidade-da-lei-penal-aos-serial-killers-brasileiros-aspectos-juridicos-do-assassinato-em-serie


TRINDADE, Jorge; BEHEREGARAY, Andréa; e CUNEO, Mônica Rodrigues. Psicopatia – a máscara da justiça. - Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2009.


CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal – Parte Geral, vol. I. 15ª ed., rev. e atual. - São Paulo: Saraiva, 2011.


CASOY, Ilana. Serial killer made in brasil. 2ª. ed. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Ediouro, 2009.

___________. Serial killer, louco ou cruel? 8ª. ed. rev. e ampl. - São Paulo: Ediouro, 2008.


Transtornos de personalidade, psicopatia e serial killers: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-44462006000600005


Stone MH. Serial sexual homicide: biological, psychological, and sociological aspects. J Personal Disord. 2001;15(1):1-18: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_nlinks&ref=000128&pid=S1516-4446200600060000500026&lng=en

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